segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Decorar, copiar e reproduzir

Estou feliz por finalmente estar aprendendo matemática, depois de anos e anos de fracasso nessa matéria. Nunca me interessei em aprendê-la devidamente até este ano, quando a pressão do vestibular me forçou a tal. Também não imaginei que fosse conseguir compreender a álgebra, a trigonometria e a geometria espacial; logaritmo pra mim era bicho de sete cabeças (bem, digamos que agora são 5 cabeças, porque ainda estou estudando) e gráficos eram pesadelos. O que tudo isso tem a ver com o título? A fonte dos meus problemas: a decoreba.

Eu não sei se é descaso dos professores ou se é a política dos colégios em que estudei (todos particulares), mas desde cedo fui "doutrinado" a decorar, a copiar e a reproduzir fielmente. Tive pavor de história até a 6ª série, devido à professora megera que simplesmente ia relatando os fatos do passado, sem apresentar as relações de causa e consequência entre eles ou o contexto em que estavam inseridos.

Quando mudei de escola, na 7ª série, passei a me apaixonar pela matéria. O professor (que foi o primeiro com quem fiz amizade) era muito bom e nos estimulava a refletir, a comparar, a analisar historicamente os eventos. Ele pegava, por exemplo, algo que acontecia durante o período do Brasil colônia e traçava paralelos com o que acontece ainda hoje. Dizia que o mais importante não é conhecer os fatos, mas ter uma visão histórica sobre eles, ou seja, entender o que os causou e quais foram suas consequências. Isso é estudar história!

Nós não precisamos de nenhum controle de pensamento

No campo das ciências, não me foi diferente. Sempre fui amante delas, mas, infelizmente, quase sempre estas me foram ensinadas de forma fria, calculista, nominal. A biologia, por exemplo, é limitada a um monte de nomes complicados e suas funções e relações com outros nomes complicados; a quimica e a física são reduzidas a complexos cálculos matemáticos, em que se mudam apenas as variáveis e as fórmulas. Assim fica difícil visualizar o fenômeno, entender o que realmente acontece na prática, ver a beleza da ciência.


Algo vem me deixando bastante indignado desde o ano passado, quando comecei a dar aulas de reforço para a minha irmã menor (que hoje estuda no colégio que eu estudei até a 6ª série, das professoras megeras): o excesso de memorização mecânica, a decoreba.

Em geografia, por exemplo, uma vez estávamos estudando sobre as diversas regiões do Brasil, começando pelo nordeste. Imaginei que a professora iria cobrar na prova a cultura do povo nordestino, os problemas que eles enfrentam, como a seca e a pobreza, etc. Em vez disso, ela queria que as crianças decorassem nomes de pratos típicos. Isso mesmo, decorar pratos típicos!! Ta bom que era a 4ª série e as crianças não têm tanta maturidade para entender a realidade de uma região distante, mas decorar pratos típicos é sacanagem. Na região sul, eu lembro que tinha que decorar nomes de rios que fazem divisa com outros países e outros detalhes irrelevantes. Isso sem contar a clássica relação de estado/capital, que sempre aparece. Em história é ainda pior, mas não vou nem comentar poque isso me enoja.

Resultado: minha irmã consegue reproduzir, como um robô, vários conteúdos, mas não sabe o que significam, não tem a menor idéia de como seus conhecimentos podem ser postos em prática e não enxerga o contexto global.

Quando vou ensinar-lhe as matérias que tem dúvidas, busco sempre maneiras dela visualizar, raciocinar, usar a lógica e aprender de verdade. Sem decorar nada, as notas dela passaram a aumentar consideravelmente nas provas e é recompensador quando ela vê alguma coisa na televisão e comenta comigo: "ahhh, isso acontece por causa daquilo que você me explicou" (e faz uma relação entre os assuntos).

Quanto a mim, passei a enxergar a matemática como uma matéria lógica, dedutível. As fórmulas não são mais decoradas, mas compreendidas, visualizadas, analisadas até fazerem sentido. Como estou estudando sozinho (e tirando dúvidas com os amigos), não sofro com a repreensão de professores nem sigo métodos prontos.

Para se ter uma idéia de como isso é danoso, uma professora de matemática que tive no ensino fundamental era tão rígida com relação a seus métodos de calcular que exigia que todos fizessem exatamente da mesma forma que ela (exemplo hipotético: 2+2 é certo, 3+1 não). Que tipo de adultos essas crianças se tornarão, se desde cedo sua curiosidade e criatividade são castradas, uniformizadas e direcionadas por um caminho estreito?

Esse é um dos fatores em que ainda estamos, como Estado e sociedade, muito atrasados em relação a outros países, e o pior de tudo é que se trata de mais um ciclo vicioso. Estamos matando mentes geniais e cientistas brilhantes e criando uma nação de seres humanos mecanizados que, por sua vez, vão continuar encobrindo o desejo do saber das gerações posteriores.

Abraços,

Jack Waters

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